segunda-feira, 30 de maio de 2011

Artigo de Dr. Horácio Rafael de Aguiar

O QUE É O DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO?
Segundo Nélson Nery Júnior1, “o princípio do duplo grau de jurisdição tem íntima relação com a preocupação dos ordenamentos jurídicos em evitar a possibilidade de haver abuso de poder por parte do juiz, o que poderia em tese ocorrer se não estiver a decisão sujeita à revisão por outro órgão do Poder Judiciário”.
O princípio do duplo grau de jurisdição é visto como uma expectativa de controle de decisões jurídicas dos órgãos inferiores por órgãos judiciais superiores e também a faculdade aos partícipes da ação de ter o direito de questionar contra um provimento jurisdicional desfavorável as suas pretensões, proporcionando mais transparências as decisões do Poder Judiciário.
Portanto, necessário se faz esclarecer que, o duplo grau de jurisdição torna menos célere a tramitação do processo, propiciando, principalmente, um afrontamento com a efetividade da jurisdição. Corroborando visivelmente uma afronta com o que preconiza a EC 45/04.
RESTRIÇÃO AO PRINCÍPIO DO DUPLO GRAU DE JURISDIÇÃO
Em virtude das modificações ocorridas na legislação processual brasileira, com o advento da lei 10.352/01, o parágrafo terceiro foi acrescido ao texto original, passando a dispor com ulterior texto, determinando a possibilidade de julgamento por instância superior, mesmo em causas de competência de instância inferior. Desde que, a causa esteja abordando sobre questão exclusivamente de direito e estiver em condições de imediato julgamento (causa madura) matéria unicamente de mérito.
Nos casos de extinção do processo sem julgamento do mérito, § 3º do art. 267, o tribunal pode julgar desde logo a lide, Mesmo visando à celeridade da prestação jurisdicional e
conseqüentemente a satisfação do objetivo pretendido, tornando mais rápida a efetividade da jurisdição. A inclusão deste parágrafo tornou-se elemento de animadas e calorosas querelas em múltiplos aspectos, especialmente, no que tange à transgressão ou não ao princípio do duplo grau de jurisdição.
O duplo grau de jurisdição apresenta duas justificativas excepcionais. A primeira é o saneamento para se prevenir de prováveis falhas e excessos cometidos pelos magistrados. A segunda é suavizar o sentimento de insurreição, de injustiça, que comumente avança contra a parte vencida em toda e qualquer pendência.
Apesar de sua altíssima relevância no ordenamento jurídico brasileiro, a Carta Magna em vigor, não trouxe, explicitamente, o princípio em análise em seu bojo, contudo, veja-se a lição de Nelson Nery Júnior:
Segundo a Constituição Federal vigente, há previsão para o princípio do duplo grau de jurisdição, quando se estabelece que os tribunais do país terão competência para julgar causas originariamente e em grau de recurso. Em seu art. 102, II, dizendo que o STF conhecerá em grau de recurso ordinário, outras determinadas e, também, pelo n. III do mesmo dispositivo constitucional tomará conhecimento, mediante recurso extraordinário, das hipóteses que enumera, evidentemente criou o duplo grau de jurisdição.
Denota-se que a Constituição Federal traz em seu bojo limitações de abrangência desse princípio, como, por exemplo, enumerar os casos em que cabe o recurso ordinário ou extraordinário, ao dizer que as decisões do Tribunal Superior Eleitoral são irrecorríveis, salvo quando contrariem a CF (art. 121, § 3º), entre outras hipóteses.
Acerca do tema o comentário de Cândido Rangel Dinamarco:
Afaste-se desde logo a suspeita de que este princípio peque por inconstitucionalidade ao permitir um julgamento per saltum, ficando, pois excluída a decisão da causa pelo juiz inferior – porque na ordem constitucional brasileira não há uma garantia do duplo grau de jurisdição. A Constituição Federal prestigia o duplo grau como princípio, não como garantia, ao enunciar seguidas vezes à competência dos tribunais para o julgamento dos recursos;
mas ela própria põe ressalvas à imposição desse princípio, especialmente ao enumerar hipóteses da competência originária dos tribunais, nas quais é quase sempre problemática a admissibilidade de algum recurso, seja para o próprio tribunal, seja para outro de nível mais elevado. Em face disso, em princípio não é inconstitucionalmente repudiada uma norma legal que confine em um só grau jurisdicional o julgamento de uma causa ou que outorgue competência ao tribunal para julgar alguma outra, ainda não julgada pelo juiz inferior.
Tanto para reconhecer a violação ao princípio processual quanto para afastá-la, existe argumentos relevantes, No tocante à ofensa ao duplo grau de jurisdição, e à conseqüente supressão da primeira instância.
Há aqueles que entendem haver uma violação ao princípio do duplo grau de jurisdição, posto que subtrai do órgão julgador de primeira instância a apreciação da questão de direito substancial, a quem fora inicialmente submetida a pronunciamento, nos termos da postulação da tutela jurisdicional.
O cerceamento do duplo grau de jurisdição foi objeto de inúmeros julgados proferidos pelo Excelso Supremo Tribunal Federal, destacando-se a resenha de autoria do Prof. Humberto Theodoro Júnior, sobre alguns acórdãos afetos ao tema:
Se o julgamento de primeiro grau se restringiu às questões preliminares, não pode o tribunal, por força da apelação, apreciar desde logo o mérito da causa, É que, na espécie, não houve sequer início do exame da questão de mérito. Julgá-la originariamente em segundo grau importaria abolir o duplo grau de jurisdição. A decisão do tribunal não poderá, pois, ir além do plano das preliminares (STF, RE 71.515, 72.352, 73.716 e Ação Resc. 1.006, in RTJ, 60/207, 60/828, 62/535 e 86/71).
Deveras atraente o comentário de José Miguel Garcia Medina:
Segundo pensamos, o § 3º do art. 515 não viola a Constituição Federal. Como se viu, o princípio do duplo grau de jurisdição não é garantia constitucional. Essa concepção, no entanto, como se mencionou, não é pacífica, havendo defensores de orientação contrária. Para estes, muito provavelmente o § 3º do art. 515 do CPC deverá ser considerado inconstitucional. O
fato de não estar diante de inconstitucionalidade, contudo, não torna, só por isso, menos criticável o preceito, porquanto nos casos em que, em atenção ao § 3º do art. 515 do CPC, o tribunal – ou o relator sozinho (cf. art. 557 do CPC) – julga questão de mérito que não havia sido sequer examinada pelo juízo a quo, estará realizando julgamento que só excepcionalmente poderá vir a ser reapreciado.
A questão da supressão de um grau de jurisdição já foi objeto de estudo com o advento da Lei 8.950/94, alterando a redação do artigo 544, § 3º do CPC. Acerca da matéria o sempre pertinente comentário de Nelson Nery Júnior:
O fato de o art. 544, § 3º do CPC, com redação dada pela Lei 8.950/94 permitir ao STF e STJ o julgamento direto do mérito do RE ou RESP, quando examina e dá provimento a agravo de instrumento interposto contra indeferimento daqueles recursos, não significa ofensa ao duplo grau ou "supressão" de um grau de jurisdição, pois o que o tribunal superior faz é apenas abreviar o procedimento, por medida de economia processual.
Portanto, devemos louvar esta inovação processual por haver introduzido na legislação processual, mecanismos que autorizam senão uma rápida, no mínimo, uma prestação jurisdicional um pouco mais eficiente por parte do Estado.
Uma verdadeira revelação, de que, o princípio do duplo grau de jurisdição, não se trata de garantia constitucional, se verifica na competência conferida ao STJ, para processar e julgar originariamente nos crimes comuns os governadores dos estados (art. 105, I, a, da CF/889). Assim sendo, avaliar a novidade processual como um cerceamento de instância, é tão equivocado quanto, certificar que há supressão de instâncias nas ações de competência originária dos tribunais, elencadas na competente Carta Magna.
Pertinente ainda a lição de Joana Carolina Lins Pereira :
Para os que sustentam que a consagração do duplo grau reside no art. 5º, inc. LV da Constituição da República, responde o STF que a "ampla defesa" a que alude o preceito é exercida nos termos e limites da lei infraconstitucional, inexistindo norma na Carta Magna que garanta o direito a um duplo grau de jurisdição sem quaisquer limitações.
O Excelso Pretório tem utilizado como justificativa para se admitirem exceções infraconstitucionais ao duplo grau, o art. 102, inc. III, da CF/88. De fato, já decidiu o STF, v.g., no acórdão do AGRAG 209.954/SP (Rel. Min. Marco Aurélio, j. em 15.09.1998, DJ 04.12.1998, p. 15), que, ‘Diante do disposto no inciso III do art. 102 da Carta Política da República, no que revela cabível o extraordinário contra decisão de última ou única instância, o duplo grau de jurisdição, no âmbito da recorribilidade ordinária, não consubstanciada garantia constitucional’.
“Sempre que damos um passo à frente com o direito eleitoral, a democracia avança e mais se afirma. Onde a democracia se impõe, há a garantia para a realização da justiça e da paz, os espaços se abrem para o trabalho, a impunidade não tem vez.
O direito eleitoral é o primeiro direito na democracia. Sem o direito eleitoral não há democracia e sem democracia os outros direitos nem existem. ”(Apud Cerqueira, 2004.)

Nenhum comentário:

Postar um comentário